Arquivos Mensais:junho 2013

Marcas podem contemplar 60 anos de diferença em seu público?

Em um filme antigo que deve passar na sessão da tarde de vez em quando (“Ensina-me a viver”) um jovem obcecado com a morte redescobre a vida no convívio amoroso com Maude, uma mulher de 79 anos. A troca é prazerosa e vital a ambos, à despeito de como o mundo externo lhes julga.

E uma marca, pode planejar-se para todos, convivendo bem na estratégia públicos muito distintos? Não existe uma resposta única para essa pergunta. Cada caso é um caso.

A marca é um agregado de associações que cada consumidor faz em relação a um símbolo. A marca é, portanto, única para cada pessoa, ainda que a empresa centralize as mensagens e deseje que a marca seja uniforme nos corações e mentes. A elasticidade de públicos que podem se interessar pelas mesmas associações planejadas é uma medida empírica, cada marca e empresa aceita e planeja a sua.

Tomemos o Itaú: o que impede que seja o banco dos jovens e também o banco dos setentões? Nada. As associações pretendidas por um banco são amplas: solidez, transparência, segurança, presença, “caring” – elementos que convivem bem em públicos díspares.

Vejamos a Renner: uma marca de moda pode servir a senhoras de 80 anos e universitárias de 20? É muito mais difícil. Moda é estilo de vida e a marca é uma ferramenta simbólica de construção de quem se é. Poucas mulheres (talvez as mais retrôs…) desejariam usar as mesmas marcas que suas mães usam, quanto mais as que suas avós usam. Assim, é difícil pensarmos marcas de moda abordando públicos tão diversos e se o fizerem talvez seja justamente para se posicionar no contraste, uma estratégia até comum nesse setor.

E a Danone? Bom, uma marca de iogurte, algo que se bebe dos 8 aos 80, ainda que em doses e tipos diferentes, fora restrições nutricionais, pode muito bem reunir públicos divergentes. Uma marca mais genérica, como a água Bonafont, certamente pode, pois água é um bem que nos une na necessidade, mais que nos separa. Já para uma marca especialista em necessidades de uma fase da vida, como a Densia, não faz nenhum sentido pensar nos mais jovens.

E como se posicionar também para os mais velhos pode afetar a atitude pretendida pela marca? Uma marca que deseja imprimir um mood contemporâneo pode abranger públicos diversos? Eu diria que sim. Diversidade é um valor contemporâneo. Historicamente, muitas marcas abraçaram a diversidade sexual e racial como bandeira, desde as históricas campanhas da Benetton. A diversidade etária é a que menos tem sido abordada – e justamente por conta disso pode constituir uma estratégia interessante.

Como o adolescente Harold do filme, talvez as marcas tenham algo a ganhar se associando com as muitas Maudes maduras que existem nessa vida e que não são hoje o “target” (na linguagem curiosamente belicosa que se usa em relação aos consumidores).

Benjamin Rosenthal

“When I’m Sixty-Four” – comunicação com os maduros

Uma reclamação freqüente dos maduros é a forma como as pessoas mais jovens se dirigem a eles, de certa forma carregada de tom paternalista. Quem nunca conversou com alguém bem mais velho de forma diferente da que conversa com pessoas da mesma idade, ou que sejam apenas um pouco mais novas ou mais velhas?

Quais as origens dessa linguagem paternalista? De certa forma as “folk theories” que governam boa parte da vida das pessoas apregoam que os mais velhos têm dificuldade de entender e que, portanto, deve-se conversar com eles de forma lenta e simples. Mito. Na verdade, fora algum problema de audição, que não é incomum no processo de envelhecimento, ou alguma falta de conhecimento sobre o tema da conversa, qualquer pessoa com mais de 75 anos fala de tudo e processa informações quase que da mesma forma que os mais jovens (talvez um pouco mais lenta e organizadamente, alguém mais maldoso acrescentaria…).

Qual a conseqüência da linguagem paternalista? A pessoa mais velha pode se irritar com o excesso de cuidado que algum mal-avisado emprestar ao diálogo e desistir dessa pessoa. Se você conversa com sua avó ou sua tia dessa maneira ela pode ignorar o seu erro por amor e fingir que está tudo bem. Mas se você é a caixa do supermercado que o Sr. Nestor costuma freqüentar, ele pode se irritar e isso não agrega à sua experiência de loja e ao seu nível de serviço. E se você é o gerente que o atende no banco, o respeito na comunicação eleva as chances de permanência do dinheiro do Sr. Nestor nessa instituição.

Vale lembrar que, ao tratar uma pessoa mais velha (para os padrões culturais atuais) como velha, alguém tem algo como 40 a 70% de chances de errar. Afirmo isso pois há estudos que mostram que boa parte das pessoas mais velhas não se vêem como mais velhas. Elas até vêem os outros como mais velhos mas não elas mesmas. Certo ou errado, é assim que elas constroem suas identidades e é com essa informação em mente que você deveria agir.

Como diz um trecho da letra de Lennon e McCartney (mas claro, como mudou o que é ter 64 anos de 1967 para cá…): “You’ll be older too… / And if you say the Word / I could stay with you”.

Benjamin Rosenthal

Gay and Gray

Da forma como eu vejo, as paradas GLBTS têm um sentido fundamental de libertação. Assim elas deveriam ser celebradas por todos, afinal quem não quer ser livre para fazer o que bem entende, sem ser alvo dos olhares reprovadores de segmentos da sociedade? Heterossexuais inclusive ou o preconceito não acaba atingindo a todos?

Assim, resolvi me debruçar sobre o tema da homossexualidade no envelhecimento. Descobri no excelente The Cambridge Handbook of Age and Ageing artigos escritos por pesquisadores especializados no tema.

Uma das perspectivas que mais me chamou a atenção foi a de fase no ciclo de vida. Segundo Allen (2006), gays que hoje têm 60, 70 ou 80 anos se tornaram adolescentes em uma época em que sua homossexualidade era considerada uma aberração, individual e social. Eles não contavam com o ambiente que temos hoje, muito mais favorável e tolerante aos gays e lésbicas, ainda que longe de perfeito. Também enfrentaram um ambiente profissional intolerante à sua opção sexual, o que muitas vezes impedia que assumissem sua identidade. Se para os jovens de hoje é difícil, imagine no Brasil dos anos 60?

Um segundo ponto que me chamou a atenção foi o preconceito que os próprios gays e lésbicas mais velhos sofrem dentro da própria comunidade gay (uso o termo comunidade no sentido de grupo que tem interesses, laços e códigos em comum). Parte desse preconceito é baseado no desejo pela beleza e juventude que existe na comunidade gay, assim como em toda a sociedade.

Os pesquisadores israelenses Meri-Esh e Doron (2009) constataram que envelhecer sendo gay em Israel é o mesmo que carregar 3 cruzes. A cruz de ser velho, a cruz de ser gay e a cruz de ser gay em uma comunidade gay que também hiper valoriza a juventude. Quem envelhece e deixa de apresentar um corpo atlético, com todos os sinais de juventude e da virilidade, sofre preconceito e é esquecido e tornado invisível. Aliás, segundo Bergling (2004) tanto os mais novos quanto os mais velhos têm dificuldades na comunidade gay.

Por fim, um terceiro aspecto me chamou a atenção. Segundo Allen (2006), idosos gays e idosas lésbicas acabam tendo menos suporte estrutural da família na velhice. Seus laços familiares nem sempre se mantém devido ao preconceito. Há também a ausência de filhos e netos, que poderiam cuidar dos idosos, como se faz com os heterossexuais. Por outro lado, segundo Allen, gays e lésbicas desde cedo aprendem a se virar sozinhos e constroem estratégias de criação e manutenção de laços sociais mais amplos e fortes. O estereótipo de que possuem vidas sociais mais agitadas encontra embasamento científico, se é que isso é necessário.

O termo “old fag” (ou sua tradução para o português) ganhou novo sentido para você? Então abandone-o. Use algo mais inteligente, carinhoso e próximo da realidade. “Você” é bastante adequado…

Benjamin Rosenthal

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