Marcas podem contemplar 60 anos de diferença em seu público?
Em um filme antigo que deve passar na sessão da tarde de vez em quando (“Ensina-me a viver”) um jovem obcecado com a morte redescobre a vida no convívio amoroso com Maude, uma mulher de 79 anos. A troca é prazerosa e vital a ambos, à despeito de como o mundo externo lhes julga.
E uma marca, pode planejar-se para todos, convivendo bem na estratégia públicos muito distintos? Não existe uma resposta única para essa pergunta. Cada caso é um caso.
A marca é um agregado de associações que cada consumidor faz em relação a um símbolo. A marca é, portanto, única para cada pessoa, ainda que a empresa centralize as mensagens e deseje que a marca seja uniforme nos corações e mentes. A elasticidade de públicos que podem se interessar pelas mesmas associações planejadas é uma medida empírica, cada marca e empresa aceita e planeja a sua.
Tomemos o Itaú: o que impede que seja o banco dos jovens e também o banco dos setentões? Nada. As associações pretendidas por um banco são amplas: solidez, transparência, segurança, presença, “caring” – elementos que convivem bem em públicos díspares.
Vejamos a Renner: uma marca de moda pode servir a senhoras de 80 anos e universitárias de 20? É muito mais difícil. Moda é estilo de vida e a marca é uma ferramenta simbólica de construção de quem se é. Poucas mulheres (talvez as mais retrôs…) desejariam usar as mesmas marcas que suas mães usam, quanto mais as que suas avós usam. Assim, é difícil pensarmos marcas de moda abordando públicos tão diversos e se o fizerem talvez seja justamente para se posicionar no contraste, uma estratégia até comum nesse setor.
E a Danone? Bom, uma marca de iogurte, algo que se bebe dos 8 aos 80, ainda que em doses e tipos diferentes, fora restrições nutricionais, pode muito bem reunir públicos divergentes. Uma marca mais genérica, como a água Bonafont, certamente pode, pois água é um bem que nos une na necessidade, mais que nos separa. Já para uma marca especialista em necessidades de uma fase da vida, como a Densia, não faz nenhum sentido pensar nos mais jovens.
E como se posicionar também para os mais velhos pode afetar a atitude pretendida pela marca? Uma marca que deseja imprimir um mood contemporâneo pode abranger públicos diversos? Eu diria que sim. Diversidade é um valor contemporâneo. Historicamente, muitas marcas abraçaram a diversidade sexual e racial como bandeira, desde as históricas campanhas da Benetton. A diversidade etária é a que menos tem sido abordada – e justamente por conta disso pode constituir uma estratégia interessante.
Como o adolescente Harold do filme, talvez as marcas tenham algo a ganhar se associando com as muitas Maudes maduras que existem nessa vida e que não são hoje o “target” (na linguagem curiosamente belicosa que se usa em relação aos consumidores).
Benjamin Rosenthal