Arquivos Mensais:junho 2014

Stitch, o Tinder dos Maduros

Ficar solteiro (ou viúvo) é algo corriqueiro entre maduros e, especialmente, maduras. Mulheres na faixa dos 60 e 70 anos se queixam com freqüência da ausência de parceiros disponíveis. Muitas mulheres adorariam reconstruir suas vidas amorosas depois de uma separação ou da morte do parceiro (bem mais freqüente que a morte da parceira). Inclui-se aí os relacionamentos homoafetivos na terceira idade.

O Stitch, assim como o Tinder, são catalizadores de relacionamentos. Aproximam os maduros das maduras, sem que eles tenham que perder tempo em se “esbarrar naturalmente” no mundo offline. Algo que para uma jovem senhora poderia levar 1 ano (conhecer 5 ou 6 solteirões), em uma noite de diversão gamificada está resolvido.

Essa é uma segunda característica do Stitch. Conversando com um amigo outro dia ele matou a charada. Parte do sucesso do Tinder, assim como do Stitch, está no jogo, nas ações de escolha (“essa sim, essa não”), que podem ser premiadas com um match. A antecipação, a expectativa, seguida do prêmio do match, por si só, já vale o uso do aplicativo. Gamefication direcionado ao ego.

A terceira característica do Stitch é a que deve encantar muitas senhoras e senhores. A possibilidade de conversa por muitos minutos ou horas com um estranho. O fenômeno “strangers in a train” entra aqui com força. Muitas vezes temos a capacidade de nos abrir com completos estranhos sobre temas que não discutiríamos com pessoas mais conhecidas. A ausência de compromisso e de qualquer necessidade de se manter uma imagem (que temos com nossos amigos mais próximos) muitas vezes impede que sejamos honestos sobre determinados temas. No Stitch você pode contar como tem sido difícil a ausência de uma pessoa (ou como tem sido um alivio…).

E, por fim, o benefício óbvio – a possibilidade do encontro. O Stitch dá às senhoras e senhores a possibilidade de vários encontros em um espaço curto de tempo. Isso elimina a solidão, gera expectativa e ansiedade, anima a vida e dá a eles poder de escolha, de sair, namorar e casar com pessoas que são bacanas e que combinam. O app é realista em sua promessa:

“not everyone is looking for love” > sim, nessa idade esse pode não ser mais um objetivo como dos mais jovens e românticos. O que se deseja é companhia, sexo, algo mais palpável. Por isso o site propaga: “but everybody needs a companion.”

Obviamente o Stitch servirá para maduros mais íntimos com apps e mobile, mas é óbvio que ele também incentivará muitos solteiros a se tornar mais engajados em tecnologia. Enquanto escrevo esse post o Stitch estava disponível na Califórnia e na Austrália. Mas deve em breve chegar a todos os lugares. Mal posso esperar para ter 60 anos…

Benjamin Rosenthal

http://www.dailydot.com/technology/stitch-tinder-seniors/

Impondo valores geracionais

Meu primeiro impulso ao ler a reportagem sobre Harriette Thompson, uma recordista da longevidade nas maratonas foi de contentamento – muito bom ver alguém com 91 anos completando uma prova com essa dificuldade.

 

Meu segundo pensamento foi de déjà vu. Era mais uma reportagem que ignorava as diferenças de valores entre as gerações, assumindo que pessoas de 91 anos se comportam movidos pela competitividade.

Conheço bem o universo dos corredores, jovens e maduros. Parte da minha tese de doutorado foi junto a eles. De fato o valor da competitividade é um elemento importante na cultura da corrida de rua e competição, mas é um valor dos mais jovens. Esses treinam para se superar, para superar os outros, para sentir e medir seu desempenho, para narcisicamente tornear os músculos, para observar sua técnica melhorar semana após semana. Enfim, competição intra e entre sujeitos é O valor na corrida de rua.

Mas entre os mais maduros não é bem assim. A enorme maioria dos maduros corre por bem estar e justamente se afasta de objetivos e provas mais ambiciosas pois já viu seus pares se contundir seriamente e se afastar da corrida. O objetivo não é a chegada, é a corrida, ou para usar uma idéia de Montaigne: “De todos os prazeres conhecidos, a busca é o mais agradável”.

Maduros são maduros, seus objetivos, valores e fase de vida são distintos. Um dos erros mais comuns é retratá-los por lentes da juventude, por valores de uma sociedade ainda bem jovem. E ao fazer isso, esconde os valores de pessoas com 70, 80, 90 anos. Não, não é legal eles terem que se adequar à competitividade e à individualidade que move quem tem 20, 30 ou 40 anos.

É claro que terminar a Rock & Rock Marathon de San Diego com um recorde mundial é muito bom. Longe de negar isso, eu apenas digo (e para isso uso esse caso) que essa história não reflete uma realidade mais ampla, na verdade ela fala de uma exceção e fala com uma lente de uma outra geração. Quem lê pensa: nossa, ela realmente se superou nisso. Na verdade sua frase final mostra que ela se poupou ao correr uma maratona e justamente por isso terminou bem:

“Lots of times [after the races], I see young girls coming in and limping, hardly able to move, and I think, ‘Well that’s pretty good that I don’t feel that bad’.”

Benjamin Rosenthal

Fonte:

http://www.runnersworld.com/runners-stories/91-year-old-to-run-sundays-san-diego-marathon

O narcisismo e os maduros nas Redes Sociais

O Facebook tem 1.2 bilhões de usuários. O Instagram possui 200 milhões. Numa perspectiva individual, trazida da psicologia social, duas grandes motivações para as pessoas usarem as redes são: a) se conectar; b) se expressar / se apresentar ao mundo1. Nessa perspectiva, quando se fala em “se apresentar ao mundo” o narcisismo é uma das grandes motivações individuais e contextualizadas em uma cultura que valoriza a estética, o corpo e os laços com pessoas atraentes e bem sucedidas.

Curiosamente, uma das observações que faço do comportamento dos mais velhos nas Redes Sociais é que são comportamentos menos narcísicos. É comum (mas obviamente há diversidade e variância nesse mundo das redes) pessoas mais velhas se gabarem menos dos seus feitos, conhecimentos, relacionamentos, hábitos sociais e de consumo. Há inclusive juízo de valor aqui – os mais velhos observam esses comportamentos de super exposição dos mais novos com ressalvas. Frases como “eu não gosto de me expor” e “eu não gosto de me exibir” fazem parte do leque de explicações que dão para sua maior reserva nas redes sociais. Certamente não são as únicas explicações.

Os mais jovens tendem a comportamentos mais narcisistas, expõem suas vidas, de forma aberta e agigantada (vide comportamentos como os selfies no Facebook e os diários “mundo de Caras” no Instagram). As exceções entre os mais velhos se tornam até conhecidas justamente pelo caráter inédito e surpreendente. Figuras como a Grandma Betty ficaram populares nas redes sociais, não somente por serem admiráveis mas também por serem diferentes.

Os mais velhos também tendem a não se engajar em comportamentos agressivos, outra característica comum das pessoas com comportamento narcísico. O comportamento de agressão nos narcisos é entendido como uma forma de defesa, de proteção de sua auto imagem, em geral agigantada e difícil de sustentar. Os mais velhos parecem buscar muito mais a inserção do que o destaque. Destaque serve mais em cenários competitivos, algo que os mais velhos abandonaram ou reduziram em algum momento na sua trajetória.

O fenômeno Grandma Betty pode ser entendido, portanto, como uma vitrine, na perspectiva de quem observa e um chamado de inclusão, na perspectiva de quem posta. Não é tanto pelos 15 minutos de fama, é mais por 15 minutos de contato e conexão.

Benjamin Rosenthal

Fontes:

1 – Nadkarni, A., Hoffman, S. G. (2012). Why do people use Facebook? Personality and Individual Differences, 52, 243-249.

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