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Joni Mitchell e Saint Laurent: não se trata de uma modelo-idosa, mas de uma modelo-musicista

Modelos são tradicionalmente bastante jovens, pessoas na casa dos 20 anos. O uso de modelos teens ou de pessoas na casa dos 30 anos também é comum, ainda que esse último grupo seja menos presente. A escolha dos modelos segue critérios bastante peculiares no universo da moda. Não são apenas os rostos que importam mas como eles se adaptam às oscilações do que a indústria da moda considera como sendo os ideais de estética momentâneos.

As escolhas das marcas e de seus stakeholders, produtores de conteúdo cultural nas indústrias da moda e da mídia, resultam de múltiplos fatores: uma identidade da marca e sua imagem pretendida, a identificação imaginada do modelo e das imagens produzidas com o público-alvo e mesmo a força do modelo enquanto marca são alguns desses fatores.

A onda contemporânea de colocar modelos mais velhos estampando campanhas de marcas segue a mesma lógica. Mais recentemente foi a vez de Saint Laurent estampar Joni Mitchell, aos 71 anos de idade, em sua casa na Califórnia, usando uma capa de couro, um chapéu e uma túnica, todas da marca.

Porque Joni Mitchell aos 71 anos?

Como se sabe, ter uma história (e construí-la de forma autêntica), ter alma, se tornar um ícone, são elementos que a indústria do luxo considera essenciais na construção da marca e para as pessoas que a desejam. Joni Mitchell tem iconicidade de sobra. Saint Laurent respeita e se conecta com a história dessa musicista, trazendo-a para a sua, ainda que apenas como um tijolinho nessa marca tradicionalíssima que é Saint Laurent.

Mas mais importante que Joni Mitchell como parte da história de Saint Laurent é como Joni Mitchell aparece, ou que escolhas a marca fez. Primeiro, Joni Mitchell aparece em um contexto que é o da música. O Saint Laurent Music Project (SLMP) se iniciou em 2013. O vídeo de abertura traz uma modelo muito jovem, algo como 20 anos, de jeans e sem camisa, andando numa praia enquanto o som bluesy rola no fundo. No SLMP já entrou desde Daft Punk e Courtney Love até Kim Gordon e Christopher Owens – é nítido que a ação com Joni Mitchell não tem nada de contra nem a favor de jovens ou velhos ou pessoas de meia idade.

Aí está o lado interessante da campanha de Saint Laurent. Ela normaliza a idade. Tanto faz. O que importa é quem se é (e o que fez e como aparenta), não quantos anos se tem. Na música há isso. A idade não compromete necessariamente quem se é, podendo tanto melhorar quanto estragar o artista. Os anos são apenas paralelos ao trabalho. Não é o tempo que importa, mas o que se faz dele.

Só que ao mesmo tempo Joni Mitchell aparece muito discretamente nas fotos. O que saiu na mídia foram 3 fotos que a designer da marca, Heidi Slimane, liberou. O que se apreende dessas imagens (abaixo) é discrição. Preto e Branco. Rosto, túnica e violão. É algo bastante essencial, como ambas, marca e cantora, são. Mas é uma essência que não revela Joni Mitchell em nenhuma face que já não esteja construída na cabeça do leitor. E também não reforça nenhuma das rugas que a cantora acumulou. Não faço a menor idéia de quais são as intenções da designer, mas o resultado, como leitor, é clean por um lado e levemente maquiador por outro. Para mim deixou a desejar. Ela já disse muito nas suas letras. Nas fotos divulgadas não diz nada.

Não se chega aos 71 anos de idade sendo Joni Mitchell para ser tão asséptica em uma campanha. Se uma marca como Saint Laurent quer aproveitar o fator idade, há outras maneiras de se fazer. Saint Laurent não parece querer falar, portanto, de idade. Quer falar de ícones, de cultura, de música. Não se trata de uma modelo idosa, como diz o The Guardian. Trata-se de uma modelo cantora cuja idade foi atenuada – uma forma comum de “idadismo” (de ageism, na lingua inglesa).

Fontes:

http://www.theguardian.com/fashion/fashion-blog/2015/jan/09/joni-mitchell-the-new-face-of-saint-laurent-stylewatch

http://www.marieclaire.co.uk/news/fashion/548156/joni-mitchell-is-the-face-of-saint-laurent-s-spring-2015-advertising-campaign.html#index=1

http://www.ysl.com/corporate/us/saint-laurent-music-project/

 

A moda não está fora de moda – não para os fashion grandpas

Já tem um bom tempo que as vovós cheias de estilo já são cobertas pelas revistas e blogs de moda. Elas são mulheres de 70, 80, 90 anos que se vestem super bem, usam ativamente a roupa para construir suas identidades, fazem de si mesmo personagens singulares, diferentes frente a tantas outras senhoras que “já não se importam tanto assim”. Nas mulheres mais jovens a moda é carne de vaca, a ponto da “moda estar fora de moda”, como declararam estilistas como Oskar Metsavaht e Fause Haten; nas mulheres maduras ela ainda é sinal de distinção.

Recentemente me deparei com os avôs cheios de estilo – os Fashion Granpas, retratados, por exemplo, em uma conta no Instagram que já tem 20k seguidores. Eles são filhos dos anos 30, 40 e 50, viveram suas juventudes em épocas tão distintas quanto o pós guerra e os anos liberadores pós-68. Nos EUA são pessoas que viram os EUA serem A superpotência e eles OS caras perante o mundo ocidental. É gente que fez a vida e viveu plenamente ou ao menos presenciou algo similar em muitos dos seus pares.

Eles chegaram aos 70, 80, 90 anos de idade e abraçaram uma atuação estética diante da vida, refletida em muitas formas de expressão e, obviamente, consumo de moda. Interessante notar que essa não é uma geração criada em um ambiente no qual a moda é “dada”. Se vestir bem é um valor cultural global nascido nos anos 80, ampliado nos 90 e horizontalizado completamente a partir de 2000 –  as novas gerações já nascem respirando moda, como qualquer pai de meninas e meninos de 6 anos já sabem. Esses avôs fashion entraram no jogo, aprenderam os códigos, se transformaram e se inseriram em formas mais contemporâneas de expressão e, ao se vestir com um olhar atento, deixam implícito seu manifesto ao mundo:

“eu estou aqui (também) e eu vou aproveitar minha vida, não como um apêndice da sociedade, não como alguém que custa caro para a seguridade social, mas como eu quiser aproveitar. Eu vou ocupar as ruas, bares, cafés, show e eu vou disputar a arena pública com vocês, jovens. Eu tenho poder econômico. Eu tenho poder político. Eu tenho experiência de vida. E eu também vou entrar para essa fogueira das vaidades estética que vocês ergueram. Então vira essa cara de que eu-não-tô-entendo-de-nada pra lá e vê se aprende alguma coisa comigo. By the way, adorei suas calças justas. Onde compro uma dessas?”

Então “a moda está fora de moda”? Depende de quem usa…

Benjamin Rosenthal

 

Stitch, o Tinder dos Maduros

Ficar solteiro (ou viúvo) é algo corriqueiro entre maduros e, especialmente, maduras. Mulheres na faixa dos 60 e 70 anos se queixam com freqüência da ausência de parceiros disponíveis. Muitas mulheres adorariam reconstruir suas vidas amorosas depois de uma separação ou da morte do parceiro (bem mais freqüente que a morte da parceira). Inclui-se aí os relacionamentos homoafetivos na terceira idade.

O Stitch, assim como o Tinder, são catalizadores de relacionamentos. Aproximam os maduros das maduras, sem que eles tenham que perder tempo em se “esbarrar naturalmente” no mundo offline. Algo que para uma jovem senhora poderia levar 1 ano (conhecer 5 ou 6 solteirões), em uma noite de diversão gamificada está resolvido.

Essa é uma segunda característica do Stitch. Conversando com um amigo outro dia ele matou a charada. Parte do sucesso do Tinder, assim como do Stitch, está no jogo, nas ações de escolha (“essa sim, essa não”), que podem ser premiadas com um match. A antecipação, a expectativa, seguida do prêmio do match, por si só, já vale o uso do aplicativo. Gamefication direcionado ao ego.

A terceira característica do Stitch é a que deve encantar muitas senhoras e senhores. A possibilidade de conversa por muitos minutos ou horas com um estranho. O fenômeno “strangers in a train” entra aqui com força. Muitas vezes temos a capacidade de nos abrir com completos estranhos sobre temas que não discutiríamos com pessoas mais conhecidas. A ausência de compromisso e de qualquer necessidade de se manter uma imagem (que temos com nossos amigos mais próximos) muitas vezes impede que sejamos honestos sobre determinados temas. No Stitch você pode contar como tem sido difícil a ausência de uma pessoa (ou como tem sido um alivio…).

E, por fim, o benefício óbvio – a possibilidade do encontro. O Stitch dá às senhoras e senhores a possibilidade de vários encontros em um espaço curto de tempo. Isso elimina a solidão, gera expectativa e ansiedade, anima a vida e dá a eles poder de escolha, de sair, namorar e casar com pessoas que são bacanas e que combinam. O app é realista em sua promessa:

“not everyone is looking for love” > sim, nessa idade esse pode não ser mais um objetivo como dos mais jovens e românticos. O que se deseja é companhia, sexo, algo mais palpável. Por isso o site propaga: “but everybody needs a companion.”

Obviamente o Stitch servirá para maduros mais íntimos com apps e mobile, mas é óbvio que ele também incentivará muitos solteiros a se tornar mais engajados em tecnologia. Enquanto escrevo esse post o Stitch estava disponível na Califórnia e na Austrália. Mas deve em breve chegar a todos os lugares. Mal posso esperar para ter 60 anos…

Benjamin Rosenthal

http://www.dailydot.com/technology/stitch-tinder-seniors/

Impondo valores geracionais

Meu primeiro impulso ao ler a reportagem sobre Harriette Thompson, uma recordista da longevidade nas maratonas foi de contentamento – muito bom ver alguém com 91 anos completando uma prova com essa dificuldade.

 

Meu segundo pensamento foi de déjà vu. Era mais uma reportagem que ignorava as diferenças de valores entre as gerações, assumindo que pessoas de 91 anos se comportam movidos pela competitividade.

Conheço bem o universo dos corredores, jovens e maduros. Parte da minha tese de doutorado foi junto a eles. De fato o valor da competitividade é um elemento importante na cultura da corrida de rua e competição, mas é um valor dos mais jovens. Esses treinam para se superar, para superar os outros, para sentir e medir seu desempenho, para narcisicamente tornear os músculos, para observar sua técnica melhorar semana após semana. Enfim, competição intra e entre sujeitos é O valor na corrida de rua.

Mas entre os mais maduros não é bem assim. A enorme maioria dos maduros corre por bem estar e justamente se afasta de objetivos e provas mais ambiciosas pois já viu seus pares se contundir seriamente e se afastar da corrida. O objetivo não é a chegada, é a corrida, ou para usar uma idéia de Montaigne: “De todos os prazeres conhecidos, a busca é o mais agradável”.

Maduros são maduros, seus objetivos, valores e fase de vida são distintos. Um dos erros mais comuns é retratá-los por lentes da juventude, por valores de uma sociedade ainda bem jovem. E ao fazer isso, esconde os valores de pessoas com 70, 80, 90 anos. Não, não é legal eles terem que se adequar à competitividade e à individualidade que move quem tem 20, 30 ou 40 anos.

É claro que terminar a Rock & Rock Marathon de San Diego com um recorde mundial é muito bom. Longe de negar isso, eu apenas digo (e para isso uso esse caso) que essa história não reflete uma realidade mais ampla, na verdade ela fala de uma exceção e fala com uma lente de uma outra geração. Quem lê pensa: nossa, ela realmente se superou nisso. Na verdade sua frase final mostra que ela se poupou ao correr uma maratona e justamente por isso terminou bem:

“Lots of times [after the races], I see young girls coming in and limping, hardly able to move, and I think, ‘Well that’s pretty good that I don’t feel that bad’.”

Benjamin Rosenthal

Fonte:

http://www.runnersworld.com/runners-stories/91-year-old-to-run-sundays-san-diego-marathon

O narcisismo e os maduros nas Redes Sociais

O Facebook tem 1.2 bilhões de usuários. O Instagram possui 200 milhões. Numa perspectiva individual, trazida da psicologia social, duas grandes motivações para as pessoas usarem as redes são: a) se conectar; b) se expressar / se apresentar ao mundo1. Nessa perspectiva, quando se fala em “se apresentar ao mundo” o narcisismo é uma das grandes motivações individuais e contextualizadas em uma cultura que valoriza a estética, o corpo e os laços com pessoas atraentes e bem sucedidas.

Curiosamente, uma das observações que faço do comportamento dos mais velhos nas Redes Sociais é que são comportamentos menos narcísicos. É comum (mas obviamente há diversidade e variância nesse mundo das redes) pessoas mais velhas se gabarem menos dos seus feitos, conhecimentos, relacionamentos, hábitos sociais e de consumo. Há inclusive juízo de valor aqui – os mais velhos observam esses comportamentos de super exposição dos mais novos com ressalvas. Frases como “eu não gosto de me expor” e “eu não gosto de me exibir” fazem parte do leque de explicações que dão para sua maior reserva nas redes sociais. Certamente não são as únicas explicações.

Os mais jovens tendem a comportamentos mais narcisistas, expõem suas vidas, de forma aberta e agigantada (vide comportamentos como os selfies no Facebook e os diários “mundo de Caras” no Instagram). As exceções entre os mais velhos se tornam até conhecidas justamente pelo caráter inédito e surpreendente. Figuras como a Grandma Betty ficaram populares nas redes sociais, não somente por serem admiráveis mas também por serem diferentes.

Os mais velhos também tendem a não se engajar em comportamentos agressivos, outra característica comum das pessoas com comportamento narcísico. O comportamento de agressão nos narcisos é entendido como uma forma de defesa, de proteção de sua auto imagem, em geral agigantada e difícil de sustentar. Os mais velhos parecem buscar muito mais a inserção do que o destaque. Destaque serve mais em cenários competitivos, algo que os mais velhos abandonaram ou reduziram em algum momento na sua trajetória.

O fenômeno Grandma Betty pode ser entendido, portanto, como uma vitrine, na perspectiva de quem observa e um chamado de inclusão, na perspectiva de quem posta. Não é tanto pelos 15 minutos de fama, é mais por 15 minutos de contato e conexão.

Benjamin Rosenthal

Fontes:

1 – Nadkarni, A., Hoffman, S. G. (2012). Why do people use Facebook? Personality and Individual Differences, 52, 243-249.

Alzheimer e Amor

Esbarrei com um vídeo sobre um idoso que cuida de sua esposa com Alzheimer e ele me provocou (veja o video no final). Decidi escrever sobre isso. No lugar de abordar o tema de forma analítica, trazendo fatos, interpretações e implicações, como usualmente faço, decidi escrever na forma de poesia, na visão do indivíduo que cuida. Afinal era Alzheimer, merecia um esforço cognitivo maior da minha parte. Há amadorismo bem intencionado aqui, mas não conte com grandes resultados.

 

Envelhecemos

Proteínas tóxicas

Cognições declinantes

Os hábitos, a genética, o acaso…

Alzheimer

 

Alzheimer e amor

Aprende-se a estar

A cuidar

A retribuir

Se sacrificar

 

Amor e Alzheimer

Banhar

Vestir

Jantar

Medicar

 

Alzheimer e amor

Fralda

Papel higiênico

Pasta de dente

Anticolinesterásicos

 

Amor e Alzheimer

Excrescências

Cheiros

Ruins

Bem ruins

 

Alzheimer é amor

Assistir

Se anular

Se sacrificar

Crescer no possível

 

Amor é Alzheimer

Lembrar pelo desmemoriado

Fazer pelo menos capacitado

Organizar para o confuso

Toma tempo; muda a vida

 

Alzheimer é amor

Alzheimer é

Amor não é

Amor se faz

O que você faria?

 

Benjamin Rosenthal

 

What is Love?

Nota: Até os 65 anos de idade as chances de incidência são de menos de 1%. Depois disso dobra a cada 5 anos. É uma doença típica da 4a idade. Depois dos 85 anos de idade as chances de se enfrentar o Alzheimer são de 30 a 40%. Nos EUA a Alzheimer’s Association estima que 1 a cada 9 pessoas com mais de 65 anos tem Alzheimer. A OMS estima que existam no mundo de 24 a 37 milhões de pessoas com Alzheimer. Isso pode dobrar até 2030 por conta das transformações na pirâmide etária populacional que vem ocorrendo no mundo todo. Alguns estudos mostram uma tendência de diminuição na % de pessoas idosas com a doença, possivelmente devido à adoção de hábitos mais saudáveis ocorrida (em muitos países) nos últimos 20 anos.

 

 

 

 

 

 

Fontes:

Alzheimer’s Association (2013). Alzheimer’s Disease Facts and Figures

Stähelin, H. B. (2005). Promoting health and wellbeing in later life. The Cambridge handbook of age and ageing, 165-177.

World Health Organization (2012). Dementia: a public health priority

Start-ups – controle e monitoramento para o público 50+

Tenho acompanhado uma quantidade significativa de start-ups e mesmo empresas sólidas criando soluções para o mercado da maturidade. São empresas com a capacidade de ofertar serviços que potencializam os maduros, trazem soluções para seus problemas cotidianos e simplificam suas vidas por meio de tecnologias de monitoramento, localização, medição biomédica, bases de dados ou crowdsourcing. Vou listar aqui 4 novos negócios que se basearam em um ou mais desses conceitos.

A Accel Diagnostics é um empresa que oferece testes de sangue que identificam potenciais doenças por meio de biomarcadores. Equivale a um teste de laboratório que se faz sem grandes complicações e é voltado tanto para o universo do home care quanto para pessoas que desejam rapidamente saber se possuem algum risco sem ter que recorrer à todo o procedimento de um laboratório.

A Healthspek oferece um local único para armazenar todas as informações relacionadas à saúde de uma pessoa – doenças que teve, consultas, exames, remédios e tratamentos que realizou, tudo armazenado para que os médicos possam consultar e ter acesso a uma visão geral do indivíduo.

A Talksession é um provedor de telemedicina que facilita o acesso a tratamentos psicológicos/psiquátricos por uma ferramenta de vídeo conferência. O software combina disponibilidades nas agendas dos profissionais com o acesso às pessoas em localidades distantes.

A Biisafe oferece um serviço para os mais esquecidos – acham suas chaves, guardam qualquer pertence e mesmo monitoram a casa do cliente, tudo conectado a um app para mobile. Os desmemoriados não precisam mais perder tempo tentando lembrar onde deixaram suas coisas.

De uma forma geral essas empresas são todas voltadas para o mercado da vitalidade e da potencialidade que os maduros desejam para suas vidas. A junção de tecnologias de comunicação, bases de dados, localização e aproximação de fornecedores e indivíduos são conceitos que podem ser aplicados a múltiplas necessidades e contextos inaugurando novos mercados. Esses que comentei são apenas alguns caminhos.

O desejo por uma vida saudável e por controle sobre sua rotina e sobre suas potencialidades não é exclusivo dos mais maduros mas é muito mais intenso dado o risco potencial e a constatação de que os problemas de saúde, as transformações cognitivas, as necessidades inéditas, “simplesmente acontecem”.

Os grandes conceitos aqui presentes são “controle” e “monitoramento” (individual ou de terceiros) – e se aplicam a todas as gerações, da criança que monitora seu desempenho no videogame, do adolescente que monitora seu perfil nas redes sociais, do jovem adulto que monitora seu treino de corrida no mapmyrun e também do idoso que monitora sua saúde e tem sua casa monitorada pelo seu filho.

Cada vez mais a tecnologia vai nos controlar. Isso assusta mas potencializa, podendo ser muito bom para a sociedade como um todo.

Benjamin Rosenthal

 

 

 

 

 

 

 

Betty Contra o Câncer no Instagram

Tenho seguido Grandmabetty33 no Instagram há algumas semanas. Betty é uma norte americana de 80 anos que tem câncer. Seu tataraneto, Zach Belden, decidiu documentar seus últimos momentos, que podem durar dias, meses ou (espera-se) anos.

Zach esperava que seus amigos, que conheciam sua tataravó, pudessem acompanhar e dar uma força a ela nesse período difícil. O perfil em uma semana chegou a 100 seguidores. Expandiu como vírus e em 3 meses passou a contar com 436.000 seguidores, entre eles músicos como Pharrell.

Betty é uma figura adorável. Sorri frente sua situação, em uma postura tão simpática para com seus fãs que chega a cortar o coração. Não deve ser fácil. Deve ser muito duro. Mas ela sorri.

Imagino o quanto o Instagram tem servido de combustível para Betty. Ela passou a ter uma platéia e com isso responsabilidades. Posta diariamente, dá variações ao personagem. Nas imagens ela mostra a língua azul, em picardia, exibe o V de paz e amor, aparece fazendo o cabelo ou simplesmente exibe um sorriso. Recebe milhares de likes, dezenas de comentários, força de todas as partes do planeta.

As redes sociais são um contexto possivelmente libertador, ampliador ou alentador para as dezenas milhões de Bettys que existem no mundo. Antes, elas eram alijadas da sociedade, desapareciam silenciosamente, cada vez menos presentes na teia social que nos conecta mas que quando perdemos os papéis sociais relevantes, pouco a pouco nos coloca na periferia do mapa. Com as redes sociais não precisa ser assim. Conexão virtual é conexão, como bem sabem os adolescentes. Betty aprendeu isso tarde, mas aprendeu.

Seu tataraneto deu o impulso, ensinou. Betty aprendeu e um dia vai morrer. Mas vai estar conectada a mais gente do que a maioria jamais esteve. As redes não isolam ninguém (ou ninguém que já não seja isolado). Elas trazem as pessoas mais perto. Em um dos posts Betty mostra um cartaz de papelão, no qual pede que #sejamosfelizes. Betty me emociona diariamente. Me deixa um pouco mais feliz.

Benjamin Rosenthal

http://instagram.com/grandmabetty33

Planejando o velho que serei

Olhar tantas pessoas colocando suas fotos de criança (ou dos filhos) quando passou o 12 de outubro me alegrou. Sou saudosista e guardo as maiores lembranças de uma época feliz da vida.

Mas não pude deixar de notar que, quando se passou o dia do idoso, muito menos pessoas colocaram as fotos de seus avôs e avós. Isso não é uma crítica, quem sou eu para dizer o que é certo ou errado, raramente adoto posturas morais diante de pessoas, sou falho demais para isso. Também não coloquei uma foto dos meus…

Minha intenção é outra – é entender porque isso acontece. Da mesma forma que o novo nos encanta, que uma criança desperta o melhor em nós, o velho nos assusta e dele nos afastamos. A conceituação desse movimento de afastamento pode ser buscada no Ageismo – um termo criado para explicar e denunciar o preconceito que temos diante do velho e do envelhecimento.

Uma história que adoro é contada por Gullette (2004). Em uma exposição (Face Aging) um software simulava como seria uma pessoa na evolução biológica de sua vida, aos 20, 30, 40, 50 e 60 anos (depois o software para, talvez para não estragar a exposição…). A uma criança foi perguntado “o que você achou disso?”. Sua resposta, típica das crianças, foi “eu não quero envelhecer!”.

Como isso não é possível (e nem desejável), devemos nos acostumar com os velhos que seremos, devemos preparar esse velho para viver bem e devemos nos encantar com eles, afinal vai ser do que fizermos hoje que chegaremos até eles. A velhice não apenas chega, ela pode ser preparada, ainda que jamais controlada (há o acaso…).

Assim, eu deixo aqui uma foto – é a de Roger Allsopp, um ex-cirurgião já aposentado que em 2011 se tornou o nadador mais velho a cruzar o canal da mancha, em 17 horas e 51 minutos. Que em 2014 eu volte a ser um nadador mais ativo. E reflita e me prepare melhor para meus 70, 80, 90…

Benjamin Rosenthal

 

O Brasil está bem no Global Ageing Index, mas as melhorias serão conquistas lentas

Uma das entidades mais respeitadas no estudo e propagação de conhecimento sobre o envelhecimento mundial e que trabalha para melhorar as condições de vida dessa parcela da população é a ONG AgeWatch.

Em 2013 foi elaborado o Índex de Envelhecimento Global, que visa medir por país as condições de vida em 4 grandes tópicos fundamentais ao bom envelhecimento (aquele em que existe qualidade de vida). Os quatro grandes tópicos são: segurança na renda, saúde, emprego e educação e ambiente propício. Em termos gerais o Brasil se coloca em 31o lugar, mas dentro das 4 categorias oscilamos bastante.

A categoria renda é formada pela suficiência (autonomia) de meios, provida pelo sistemas previdenciário e pela poupança individual e se manifesta em taxas relativas de pobreza na velhice, sendo também função do PIB per capta. A Suécia celebra esse ano seu centenário com um sistema universal de pensão e a Noruega possui o mesmo sistema desde 1937. O Brasil tem um bom sistema, o que o coloca em 12o lugar no mundo nesse quesito. Mas a sustentabilidade desse sistema nos atuais moldes não nos parece viável.

A categoria saúde está ligada à expectativa de vida (com saúde) e à sensação psicológica de bem estar. Os líderes nesse quesito são Suíça e Canadá. O Brasil fica em 41o lugar. Todos sabemos a razão.

A categoria emprego e educação é formada pela taxa de emprego de pessoas com mais de 60 anos e pelo nível de educação que essa população possui, um fator que influencia positivamente o primeiro. Essa categoria é liderada por Noruega e EUA. O Brasil fica em mero 68o lugar. Temos um enorme desafio nesses temas.

Por fim a categoria ambiente propício é formada pelo nível de conexões sociais, pela segurança física, pelas liberdades civis e pelo acesso a transporte de qualidade. Noruega e Áustria lideram o ranking e é interessante notar que mesmo países pobres e populosos como a Tailândia conseguem performar bem nesse quesito difícil. O Brasil encontra-se em 40o lugar nessa categoria. Políticas públicas e cidades amigas do idoso são uma das direções mais necessárias.

Veja mais sobre o assunto no ótimo site da Help Age.

Benjamin Rosenthal

Referencia:

http://www.helpage.org/global-agewatch/

Design para uma velhice mais longa e ativa

O envelhecimento da população vai trazer uma série de conseqüências para a “indústria do morar”, um grupo vasto de negócios que envolve incorporadoras, indústria moveleira, eletro-eletrônicos, decoração, pintura, tecnologias de habitação e uma série de serviços ligados à manutenção de nossas vidas em uma residência.

Mas eu não falo apenas de adaptações para os muito idosos que precisam de cuidados médicos e possuem pouca mobilidade. Essas também são importantes e envolvem quartos que permitam receber cuidados médicos,  pisos anti-derrapante, banheiro com chuveiros para cadeirantes, corredores mais largos, entre outras necessidades, até mesmo centros de cuidados diários que se aproximam do que os pais hoje conhecem como creche (mas certamente sem essa conotação). Não somente as residências terão que se adaptar mas também alguns condomínios voltados a esse setor poderão dispor de serviços compartilhados (esqueça o espaço Kids; pense no espaço Old).

As residências pensadas para vidas que evoluem dos 50 para os 60, 70, 80… terão que possuir luminosidade natural e artificial mais eficiente, na medida em que a visão se torna menos precisa. Mas soluções arquitetônicas que servem a todos não são suficientes – é preciso pensar projetos a partir da necessidade de cada pessoa ou, pelo menos, a partir das características específicas de cada grupo. Senhoras de Higienópolis não são como as do Upper East Side (fora no bolso…). E os modelos de residência muito inspirados nos EUA podem não ter nenhum apelo para brasileiros ou indianos.

Programas como Ageing in Place em Singapura e Lifetime Holmes na Inglaterra já começam a estabelecer os padrões de uma moradia pensada para o idoso em termos de acessibilidade e segurança. Empresas de arquitetura começam a se especializar nesse setor, claramente promissor.

E, se em uma primeira reflexão tudo isso parece ser arquitetura dedicada à “solução de problemas”, na verdade não precisa ser dessa forma. Os japoneses Arakawa e Gins, por exemplo, trouxeram sua filosofia de espaços para estimular mais do que para assistir ao idoso, com disposição de ambientes, portas e cores pensadas para estimular os sentidos do indivíduo, na verdade para estimular sua própria relação com suas posses e sua vida. Se esses arquiteto chegaram talvez em um limite extremo de imposição do meio ao que o indivíduo pensa, sua proposta é conceitualmente interessante (os netos adorariam uma residência como essa da foto…). Afinal, a vida é para ser vivida ativamente e uma residência precisa cumprir sua função nesse propósito.

Benjamin Rosenthal

 

 

 

5 segundos para desafiar o ”peso“ de seus 47 anos

Você já deve ter visto esta cena. Era dia 11 de abril de 2009. Uma mulher gordinha, mal vestida acaba de subir ao palco do Britain’s Got Talent. O público ri e os jurados oscilam do enfadonho ao cinismo quando ela diz que está ali por que pretende ser uma cantora profissional. Simon Cowell pergunta sua idade, ao que ela responde 47 emendando com um profético “isso é apenas uma parte de mim”. Ele a questiona o que teria dado errado até então e firme ela diz que ainda não havia tido uma chance.
O que viria a seguir, talvez uma outra parte a que ela se referia, seria um marco nos programas de talento, já que Susan Boyle interpretando “I dreamed a dream” deve ter sido um dos vídeos mais vistos no Youtube. Mais do que o sucesso repentino Susan desafiou o histórico de fama fugaz dos ganhadores de programas como Britains’ Got Talent (na verdade ela terminou o programa em segundo lugar). Foi contrata pela Sony e já vendeu mais de 15 milhões de CDs num mundo em que as pessoas preferem baixar suas músicas pela internet.
Susan Boyle com sua voz não precisou de 5 segundo para mostrar a que veio e desafiar o “peso” de sua idade. O seu exemplo é emblemático de um dos mitos mais cruéis que existem sobre as pessoas maduras. As de que o sucesso é um privilégio dos jovens. Mais do que isso, de que os maduros não mais servem (mito que se voltará contra nós como um bumerangue com os estouro das Previdências pelo mundo – tema que tratarei num artigo futuro).
Afinal, quantas matérias me lembro de ter lido na revista Exame e afins sobre jovens que chegaram lá antes dos 30. Confesso que não me lembro de nenhuma que falasse do oposto, de pessoas que chegaram ao sucesso depois dos 50, 60, 70, 80 anos.
Sorte nossa que assim não pensaram figuras como Newton que publicou sua grande obra aos 44 anos, na qual nos apresentou as Leis da gravitação e as 3 Leis de Newton. Ou Thomas Edison, que depois de grandes invenções como o fonógrafo e a lâmpada elétrica, não pendurou as chuteiras e fundou aos 41 anos nada menos que a General Eletric. Seu amigo Henry fundaria a Ford aos 40.
No Brasil o exemplo que mais contradiz esse mito é o do jornalista Roberto Marinho, que criou a Rede Globo aos 61 anos. Imagino também que os acionistas da BR Foods também não acreditem muito nessa lenda, já que a grande aposta da empresa é um senhor de 77 anos, cujo nome dispensa apresentações. Independentemente da história pregressa de Abílio Diniz, o mercado financeiro não costuma render louros a lucros passados.
Tenho a impressão que na Europa e EUA esse mito tem perdido força, mas no Brasil ele ainda é pouco contestado. Uma evidência disso é o contraste que observamos quando fazemos reuniões com equipes globais de algumas multinacionais. Cargos equivalentes em diferentes países que aqui são ocupados por pessoas de 30 anos na maioria da vezes tem pares americanos entre 45 e 55 anos. Nada contra nossos jovens, mas não estaria faltando um pouco mais de cabelos brancos em nossas empresas?

Roniclever Rosa Ribeiro

Bernarda e Lutero: invejei…

Obviamente repercutiu nas redes sociais a cena de sexo entre Bernarda e Lutero, personagens de Amor à Vida que têm entre 70 e 80 anos de idade. Uma amiga logo me enviou alguns tweets com comentários sobre as cenas. Separei alguns aqui que refletem a tensão que tradicionalmente o tema gera. Omito os autores e modifico um pouco o texto por questões éticas:

você nota que sua vida sexual está meio parada quando até os tiozinhos tiraram o atraso

ai vó, para com isso…

os velhinhos tão trepando e a gente vendo novela! Invejei!

Lindos! #Bernarda & #Lutero. Amoravida

Será que vem patrulha? Amor na #melhoridade. Fora #preconceito.

Adorei a vovó modernete. Essa é das minhas!

Novelas são uma representação importante dos valores de uma sociedade. Autores de novela, fora todo o trabalho de pesquisa sobre um tema, têm um faro nato para entender as contradições inerentes à avaliação que diferentes grupos fazem do sexo na 4a idade e o potencial que isso pode trazer em termos de ibope, dada a crescente importância econômico-cultural desse público.

Em um estudo publicado no Journal of Aging Studies, Katz e Mall já falavam sobre as transformações que o “novo velho” passava no campo sexual. Corpos turbinados por milagres farmacêuticos se potencializam como atores sexuais. Ao mesmo tempo toda uma ética contemporânea passa a exigir dos velhos que “se mantenham ativos” e da-lhe sexualidade na vida dos mais experientes. Mais que o desejo (que para muitos idosos existe, é claro) entra também a obrigação ou a pressão em não ficar para trás, não envelhecer, não perder algo que possuíram. Sexo é ótimo, pressão cultural para curti-lo, não.

Até os anos 50 a diminuição da vida sexual era considerada algo “natural”, um efeito da passagem do tempo, preenchido de conotação negativa, mas algo a ser aceito. A partir dos anos 90 a perda do sexo na 3a idade passou a ser uma decisão de cada um, e uma decisão preenchida de benefícios (na sua presença) e de malefícios (na sua ausência). Que se faça sexo na 4a idade não é surpreendente, é natural. O que surpreende é a própria surpresa.

É ainda curioso observar o jogo de aprovação / desaprovação que se estabelece nas expressões dos espectadores. São julgamentos morais que espelham a visão que os mais jovens têm dos mais velhos – uma visão em clara transformação.

Eu também invejei o casal…

Benjamin Rosenthal

 

Sessentões que passeiam de Galaxy

Estive em um evento de mobile marketing da Mobint hoje e um dos palestrantes mencionou sobre o crescimento do uso de mobile no Brasil. 80 milhões acessam a internet e 50 milhões acessam via mobile. Classe C e os mais maduros são duas das grandes fontes de crescimento. Resolvi retomar esse assunto, já tratado antes por aqui.

Percebe-se que diversos fatores explicam o movimento. A tecnologia já não assusta mais quase ninguém. A imersão é até lenta para os padrões de um indivíduo – em 2 ou 3 anos um iletrado se torna um expert no mundo do i-phone e seus aplicativos, mas rápida para os padrões das empresas. Começa-se com ligações e SMS. Rapidamente conhece-se o whatsup e o Facebook (para não perder uma foto da neta). Quando menos se nota já usam aplicativos de comparação de preço de passagem aérea, internet banking, livros digitais, sites de relacionamento… E o que são 2 ou 3 anos para as empresas? Nada…

O segundo fator é a conectividade e o aumento das relações sociais que ela traz. Pessoas com mais de 60 anos têm tempo e frequentemente querem e precisam ampliar suas relações ou mesmo se manter conectados à sua rede. Mudanças no ciclo de vida familiar, alterações na rotina de trabalho e novos interesses fazem com que pessoas com mais de 60 anos precisem da tecnologia para ampliar ou manter sua rede de relacionamentos e obter todos os benefícios que ela proporciona para quem sabe usar.

O terceiro fator é social, mescla da imitação com o poder dos influentes. Tudo que é bacana e que a amiga bacana conta que é bacana, o outro precisa conhecer. Como ficar de fora? Tecnologia (seu uso, na verdade) é “cola social”, é assunto que domina as conversas e as relações. Consome-se tecnologia para que se possa falar sobre tecnologia e para que se possa ser e se posicionar como alguém inteirado de seu mundo.

O quarto fator é o mais poderoso, apesar de ser o mais lento a se estabelecer. O hábito. Tecnologia se torna um hábito, ela se incorpora aos modos de viver, às rotinas, à programação que todos nós vamos construindo e transformando e que determinam o como fazemos aquilo que fazemos. Tecnologia vai se incorporando às práticas cotidianas dos mais maduros e aí vira um passeio, em que cada vez mais eles conhecem e se sentem tranqüilos em conhecer mais.

Benjamin Rosenthal

A Bela Velhice

Como é bom ler um  livro curto e rico. Quem navega com frequência pela produção de conhecimento nem sempre se depara com a objetividade. Mirian Goldenberg consegue isso em seu ótimo A Bela Velhice. Li em uma sentada de 1 hora e meia.

O livro dialoga com a obra de Simone de Beauvoir e descreve formas de envelhecer bem, assim como percepções que os mais velhos têm acerca do envelhecimento. O objetivo da autora é contribuir para transformar a imagem negativa que paira sobre o envelhecimento.

Um ponto chave do livro é sua distinção entre projetos de homens e mulheres com mais de 60 anos. Os dados de Mirian mostram que homens querem trabalhar, querem a presença da família, tem muito medo de solidão, do desamparo. Mulheres, por sua vez, querem liberdade, algo que elas inclusive invejam nos homens. Liberdade significa fazer o que se quer, algo que é despertado pela mudança de papéis profissionais, familiares, pela separação, pela viuvez, entre outras mudanças contextuais na vida.

Os dados que possuímos na Gagarin vão de encontro ao que Mirian coloca, com algumas distinções importantes. Não vemos nos homens um envelhecimento com a qualidade desse que as mulheres possuem. Elas saem mais, se cuidam mais, são mais sociáveis, continuam a possuir papéis relevantes em seu cotidiano. Nos homens encontramos extremos: de um lado pessoas como as que Mirian entrevistou, cheias de vida, projetos, renovando-se no terceiro ato da vida. Mas há muitos homens de terceira idade deprimidos, tristes em não se encontrar novamente, sozinhos. Eles nunca (ou pouco) falam disso, mas suas esposas falam sobre eles dessa forma.

Sobre os novos projetos Mirian usa uma abordagem identitária de Simone de Beauvoir – somente projetos conectados com quem somos trarão frutos e darão sentido à velhice de cada um. Conversamos com muitas pessoas que seguiram caminhos atrelados a desejos pessoais e se tornaram felizes, até mais do que antes foram em suas vidas. Mas também encontramos pessoas com satisfação em apenas seguir sendo quem são, trabalhando com construção, vendendo, cozinhando, passando, lavando, conversando com os amigos, etc. A felicidade na terceira idade parece fruto de pequenas coisas que permanecem conectando o indivíduo à sociedade, integrando-o a seu círculo próximo de pessoas. Não são necessários grandes projetos individuais, ainda que isso possa existir e de fato trazer satisfação plena em se viver.

Um ponto alto do livro é a descrição de como o abandono da obrigação de ser (jovialmente) bela, sexualmente ativa e corresponder a anseios de parceiros faz com que muitas mulheres se libertem e se joguem em direção ao que de fato gostam na vida. Mulheres que se permitem mostrar seus corpos como são e que não carregam mais a culpa de não ser esteticamente o que imaginam que os outros desejariam que fossem – essas sim passam a ser felizes e bem resolvidas.

É um livro recomendadíssimo para interessados no bom envelhecimento.

Benjamin Rosenthal

A memória falha, mas a história se aperfeiçoa…

A técnica narrativa em entrevista consiste, muito grosso modo, em estimular o entrevistado a narrar fatos de sua vida (por exemplo) com o máximo de detalhes possível, no tema de interesse do projeto. Narrativas contém muito mais conteúdo simbólico e emocional do que racional por espaço de texto do que entrevistas factuais. Para isso um dos papéis do entrevistador é estimular o detalhamento desses fatos, buscar os “significados êmicos” (de cada um, na sua própria perspectiva).

Quando se envelhece a memória se modifica e nossa reconstrução dos fatos é cada vez mais uma reconstrução da reconstrução da reconstrução da reconstrução…

Isso a torna “pouco confiável”? Muito pelo contrário. Narrativas são construídas na interação entre quem conta e quem escuta e a vontade de contar bem como a disponibilidade para ouvir fazem com que a construção (conjunta) de histórias seja parte importante do método. Pessoas maduras amam falar, ainda mais quando alguém está honestamente disposto a ouvir. Eles não foram tomados pelo desejo constante de “imergir online” típico dos atuais adolescentes.

A riqueza das histórias está menos está na veracidade do fato e mais naquilo que o que se conta revela sobre quem conta, afinal o que importa, ao fim e ao cabo, é a nossa subjetividade. Que histórias escolheu, que enredo empregou, quem são os atores, qual é o desfecho, o que aquilo significa são algumas das perguntas.

“A subjetividade nem sempre toma um caminho egocêntrico” (Frank e Vanderburgh, 1986). De fato a cada vez que o tema “respeito social” (ou a falta de) surge em conversas com maduros, em ocasiões em que esse desrespeito se materializou ou mesmo nas quais o respeito foi percebido, o que eu vejo não é um indivíduo que traz da memória uma ocasião que pode ou não ter sido daquela forma (e isso importa?). O que eu vejo é um grupo pedindo com urgência: “eu cheguei até aqui e mereço um tratamento decente”.

Benjamin Rosenthal

“When I’m Sixty-Four” (cuidado com o tom…)

Quando Lennon e McCartney escreveram a letra da música que inspirou esse post um velho era alguém com 64 anos. E ele deveria ser cuidado e tratado como velho. Como sabemos isso mudou, mas uma reclamação freqüente dos maduros é que a forma como as pessoas mais jovens se dirigem a eles não mudou. Quem nunca conversou com alguém bem mais velho de forma diferente da que conversa com pessoas da mesma idade?

Qual a origem disso? De certa forma as “folk theories” (o saber popular) que governam boa parte da vida das pessoas apregoam que os mais velhos têm dificuldade de entender e que, portanto, deve-se conversar com eles de forma lenta e simples. Mito. Na verdade, fora algum problema de audição, que não é incomum no processo de envelhecimento, ou alguma falta de conhecimento sobre o tema da conversa, qualquer pessoa com mais de 75 anos fala de tudo e processa informações quase que da mesma forma que os mais jovens (talvez um pouco mais lenta e organizadamente, alguém mais maldoso acrescentaria…).

Qual a conseqüência disso? A pessoa mais velha pode se irritar com o “excesso de cuidado” e desistir dessa pessoa. Se você conversa com sua avó ou sua tia dessa maneira ela pode ignorar o seu erro por amor e fingir que está tudo bem. Mas se você é a caixa da loja que o Sr. Nestor costuma freqüentar, ele pode se irritar e isso não agrega nada à sua experiência de serviço.

Vale lembrar que, ao tratar uma pessoa mais velha (para os padrões culturais atuais) como velha, alguém tem algo como 40 a 70% de chances de errar. Afirmo isso pois há estudos que mostram que boa parte das pessoas mais velhas não se vêem como mais velhas. Elas até vêem os outros como mais velhos mas não elas mesmas. Certo ou errado, é assim que elas constroem suas identidades e é com essa informação em mente que se deve agir.

Vale ainda lembrar que esse tom, esse tratamento, é uma das formas de ageismo (preconceito para com os mais velhos), um tema que em breve vai estar tão disseminado como bullying ou homofobia.

Fora que, como diz um trecho da letra de Lennon e McCartney, “You’ll be older too… / And if you say the Word / I could stay with you”.

Benjamin Rosenthal

When I Met my Sweet Loraine

Hoje eu vou falar de amor, somente de amor (que falta que faz o Tim Maia…) e abordar um lado inevitável do envelhecimento humano – teremos que conviver com pessoas que se casam e vivem juntos por mais de 50, 60, 70 anos. Que admiração, que inveja de tanto amor…

Se tem algo que eu gosto ao conversar com casais maduros é notar que eles se completam, se continuam, suas conversas são naturalmente fáceis, encaixadas, a cumplicidade é explícita, afinal são 40, 50, 60 anos juntos.

Entre casais mais maduros reduz-se o papel do indivíduo e aumenta o do casal. Um faz parte do outro (alguns chamam isso de self estendido). Viagem de férias? Decidem juntos. Supermercado e feira? Cada um assume um papel em uma engrenagem que é conjuntamente negociada. Investimentos? Ela opina ou define o perfil da aplicação, não duvide disso. Roupas? “Ela já sabe o que eu gosto”. Ele? Nunca aprenderá…

Quando um se vai? Aí depende. Muitos se afundam, homens principalmente. Entristecem, perderam uma parte da vida. A parte mais importante. Outros se reconstroem, se reinventam, mulheres principalmente.

Segundo o IBGE (PNAD), as taxas de separação caem com o passar dos anos. Dos 50 aos 59 anos ela é de 11%. Para quem tem de 60 a 69 anos, desce para 9%. Na fase dos 70 anos fica em 5%. Depois dos 80 anos apenas 2% se separam. Ainda pesquisarei os porquês desses poucos oitentões e oitentonas tão ávidos por novidade conjugal…

Nas relações afetivas os casais maduros parecem vir de Marte, de um lugar qualquer em que as relações são estáveis, eles ainda são casais modernos em um mundo pós moderno de relações liquidas.

Nessa semana Fred Stobaugh entrou para o top 10 da iTunes Store com uma música feita em homenagem à sua esposa, falecida um mês antes. Sweet Loraine, como na música de Nat King Cole, composta pelo jovem e apaixonado Fred, 96 anos, para a doce Loraine, 91. Em algum lugar ela deve ter escutado e apenas comprovado que os 73 anos de casados fizeram sentido.

Bauman, fique com essa: o passar dos anos torna os amores bastante sólidos.

 

Benjamin Rosenthal

http://g1.globo.com/musica/noticia/2013/08/musica-de-despedida-feita-por-viuvo-de-96-anos-entra-na-parada-dos-eua.html

O futuro não pertence aos jovens: eles diminuem em número no Brasil

“O futuro não é mais como era antigamente”. A frase é conhecida aqui pela letra de Renato Russo (mas o autor de fato é o jogador de baseball Yogi Berra). O Brasil sempre foi um pais muito jovem, mas esse retrato está silenciosamente mudando. A recente revisão do IBGE de projeções acerca do crescimento e da distribuição dos grupos etários no Brasil traz muitas informações relevantes nesse sentido. Vou me ater a uma delas que é quem são os públicos que crescem em termos absolutos (em número de habitantes) e quem são os públicos que diminuem ou seguem estabilizados.

Nossa população chegou em 2013 a 201 milhões de habitantes e crescerá cada vez menos. Em 2020 seremos 212 milhões, em 2030 seremos 223 milhões e em 2040 nossa população chegará a 228 milhões de habitantes, se estabilizará e começará a diminuir por volta de 20421.

Mas até lá, de onde virá esse crescimento? Esses 27 milhões de habitantes? Praticamente todos virão da faixa que tem mais que 40 anos.

Todos os grupos etários com menos de 30 anos já começaram a diminuir em termos absolutos, ano após ano são menos bebês, menos crianças e menos jovens. Nossa taxa de natalidade não tem sido nem será mais suficiente para uma reposição. O gráfico abaixo, extraído da apresentação de resultados do estudo citado do IBGE, coloca esse fato em números.

A faixa etária dos 30 aos 39 anos ainda cresce e permanecerá assim até 2020, quando se estabilizará, para entrar lentamente em declínio, a partir de 2035.

Os públicos que, desde já, crescem em termos absolutos (e obviamente, em termos relativos) e continuarão a crescer até 2040 são as pessoas com mais de 40 anos.

Não é novidade que o Brasil é um pais em processo de envelhecimento. A novidade é que ele já é um país em processo de encolhimento no número de jovens. É necessário chacoalhar governos e empresas – eles precisam colocar na pauta do dia uma agenda que contemple as implicações desse fenômeno, que aparentemente ainda não viram.

Benjamin Rosenthal

 

Fonte:

1 – http://saladeimprensa.ibge.gov.br/en/noticias?view=noticia&id=1&busca=1&idnoticia=2455

A Real Beleza Madura

É bom ver marcas trabalhando na direção correta. Muitas vezes quem é da área aponta mais as falhas, critica e mostra seus pontos de discórdia e, de vez em quando, fala de elementos positivos, em geral aqueles dificilmente questionáveis.

Nesse post eu falarei sobre a campanha Real Beleza, de Dove, e sua relação com a forma adequada pela qual marcas nesse universo devem pensar a beleza na maturidade.

Nas nossas conversas com mulheres de 50 a 80 anos realizadas nos últimos 2 anos notamos que o conceito que elas têm delas mesmas hoje em dia supera em importância qualquer desejo por uma identidade imaginada, futura ou idealizada, aquilo que em psicologia alguns denominam ideal self.

Dove fala dessa forma. Sua campanha Real Beleza busca um dialogo com a imagem atual, a “real”, que a mulher tem dela mesma e foge da armadilha de dialogar com uma mulher futura, embelezada de alguma forma por centenas de cosméticos e tratamentos que a indústria a beleza oferece.

Note, a indústria de cosméticos não está sendo posta sob critica nesse post. Eu acredito no seu papel na sociedade. Beleza melhora a auto estima e, se não perseguida de forma imponderada, têm seu papel na sociedade. “Beleza é uma promessa de felicidade” colocou Nietzsche. “Beleza é uma forma de genialidade”  foi além o Oscar Wilde. Sem esquecer o tamanho dessa indústria e a importância crescente do mercado brasileiro, em vias de ultrapassar o japonês e se tornar o 2o do mundo.

A indústria da beleza precisa produzir e vender soluções e, de certa forma, sonhos. Rostos envelhecem, sua hidratação diminui, as rugas se tornam mais profundas, manchas se acentuam, entre inúmeras outras conseqüências do passar do tempo que as mulheres preferem evitar ou adiar. Mas a escolha de que tom adotar, que consumidora retratar como protagonista, essa é uma escolha da indústria.

A real beleza dos maduros não nos parece passar pelo sonho (elemento dos mais jovens), mas sim pela beleza que se tem, com a idade e com a vida que se tem – hoje, seja ela uma beleza interna ou externa. Dove não deve ter pensado, no início dos anos 2000, que sua campanha dialogaria tanto com o público maduro e, se pensou, foi de fato um grande insight. Mas o fato é que sua abordagem, questionada muitas vezes, nos parece benchmark. Se fossemos pensar em posicionamento de marcas nesse universo hoje, esse seria o ponto de partida – o de chegada fica para cada um descobrir.

Benjamin Rosenthal

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